“A porta se abre para a escuridão, e por um longo e terrível instante ele fica imóvel diante de todas as possibilidades. E então ele se agacha sob as tábuas, passa a muleta pela brecha de um jeito atrapalhado, e entra na Casa. ”
Pág 26. ”
Em Chicago no ano de 1931, o andarilho Harper Curtis invade uma casa abandonada que tem uma característica surpreendente: quem entra nela é transportado no tempo. Ele também percebe que de algum jeito já deve ter estado ali, porque nas paredes há nomes de mulheres que ele não conhece grafados em sua própria caligrafia. Além disso, a Casa parece falar com ele, o instigando a caçar e matar as garotas iluminadas, vítimas escolhidas a dedo nas mais diversas épocas no que poderiam ser considerados crimes praticamente perfeitos. Afinal, como rastrear alguém que mata na década de 80, mas que para todos os efeitos vive na década de 30? Apenas alguém que viveu na pele o horror de quase ter sido assassinada, pode ter a tenacidade suficiente, ou melhor a incapacidade de esquecer para persistir na busca de crimes que parecem estar ligados de forma impossível. Esta é Kirby Mazrachi, que em 1989 era para ter sido mais uma das vítimas de Harper. Três anos depois ela não mede esforços para tentar encontrar quem destroçou sua vida e a ajuda vem de Dan, um ex-repórter policial que cobrira seu caso, mas que agora cobre eventos esportivos.
Além da brutalidade dos assassinatos, que Beukes preferiu não esconder e os quais são narrados sob o ponto de vista das vítimas. A história também deprime com os vislumbres de como será o futuro das pessoas próximas as elas. Isso também é potencializado pela característica de seus principais narradores. Kirby é uma protagonista amargurada, não teve uma das infâncias mais felizes e teve que amadurecer muito rápido já que a mãe em vários momentos parece viver no mundo da lua. Dan por outro lado não é muito melhor, ex-repórter policial, não é bem visto pelas forças policiais e perdeu a esposa por causa das frequentes ameaças que sofria. Quanto à Harper não há nem o que falar, um sociopata com uma visão completamente distorcida do mundo e com uma sanha assassina repulsiva.
A história de Beukes foi muito bem delineada. Mesmo pautando-se nas viagens temporais e com uma timeline completamente bagunçada, que até pode desencorajar alguns a continuarem a leitura (por favor não façam isso!), a história mantém uma coesão. E a forma como Beukes entrelaçou todos esses eventos foi surpreendente. Três vertentes literárias se unem para criar uma ótima história. O romance de época fica por conta da história de Chicago que nos é apresentada desde a década de 30, esta foi esmiuçada e mais do que pano de fundo atuou como um personagem a mais na trama. A ficção científica fica por conta dos saltos temporais, e finalmente temos o thriller policial, um lado investigativo regado com sede de vingança – garantida pela escolha da protagonista – para ninguém botar defeito. É com esses elementos que Iluminadas se torna um romance denso e com uma pegada noir que muitas vezes beira o terror, afinal já era a Casa uma entidade sobrenatural? Ou atingiu tal característica após todos os eventos que decorreram tendo ela como epicentro? Quando aliamos a isso, a árdua tarefa (mas não menos prazerosa) de traçar a linearidade dos acontecimentos, de entender as ‘brincadeiras’ envolvendo elementos passados e futuros, e como a manipulação desses elementos influencia nos eventos presentes, que influenciam no passado e vice-versa, percebemos que essa linha do tempo dobra sobre si mesma, conferindo uma circularidade à obra que sem dúvida nenhuma é a grande sacada de Beukes. Enfim, Iluminadas não foi uma leitura fácil, não foi rápida porque exige um nível de atenção imenso, mas todos esses elementos garantiram uma excelente leitura. Daquelas que mesmo com todo o quebra-cabeças montado, você ainda encontra um aspecto nebuloso, uma nova teoria, sobre a Casa, Harper e as garotas iluminadas…
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