Incendeia-me (Tahereh Mafi)

incendeiame

“Já estive aqui, digo a mim mesma. Já fui mais solitária do que isso, com menos esperança do que isso, mais desesperada do que isso. Já estive aqui antes e sobrevivi. Posso passar por isso.

Mas eu nunca havia sido tão completamente roubada. Amor e possibilidade, amizades e futuros: foram-se. Preciso começar do zero agora; enfrentar o mundo sozinha de novo. Tenho de fazer uma última escolha: desistir ou ir em frente.” página 16.

A tirar pelos acontecimentos que encerraram Liberta-me e foram revisitados sob um novo ponto de vista em Fragmenta-me, Incendeia-me, o último volume da trilogia Estilhaça-me, tinha tudo para começar com um ritmo frenético e com a batalha dos revolucionários do Ponto Ômega contra o Restabelecimento pegando fogo. Mesmo com todas as perdas e com o movimento revolucionário alquebrado, era de se esperar que um enfoque maior fosse dado a essa batalha para tentar consertar esse mundo desvalido. Contudo, Mafi decidiu focar a história exclusivamente em Juliette. E não, isso não é errado, afinal é justamente por ter esse foco que conseguimos perceber o quanto a personagem mudou ao longo do tempo e o quanto isso reflete-se no estilo da narrativa. A linguagem gráfica com textos tachados e o fluxo de consciência de alguém que se considerava louca, mudou para uma narrativa entrecortada e rápida, característica de alguém que ao libertar os próprios pensamentos viu-se tendo que enfrentar uma verborragia mental alimentada por seus medos e ao poucos chega ao que encontramos aqui: uma narrativa que vez ou outra pode até se mostrar entrecortada, quando a confiança capenga, mas no geral é feita em um texto claro, que transparece a força recém adquirida pela personagem. A forma como Mafi soube modificar sua personagem ao longo da história, inclusive imprimindo no texto as marcas desse processo é um dos pontos positivos de sua narrativa. Como disse manter o foco em Juliette não é errado, afinal é a partir dela que esperamos a catarse que promoverá a mudança nesse mundo, é ela a peça principal na luta contra o Restabelecimento. Só que todo esse movimento catártico fica relegado a segundo plano e o que antes tinha bastante espaço sim, mas não era o único foco, torna-se dominante em Incendeia-me: o romance. A história que tinha despontado como um romance em meio ao caos distópico, ganhou ares de história de heróis, ganhou uma verve política, e prometeu muito mais para no fim ser apenas um romance em meio ao caos distópico.

Não posso negar que o meu lado que gosta de romances YA ficou muito satisfeito. Com as reviravoltas do relacionamento de Juliette com Adam e dela com Warner, a narrativa ganha um baita fôlego. A química entre Juliette e Warner transpira pelas páginas e esse fato unido aos ótimos diálogos realmente fez o trio amoroso funcionar. A força recém-descoberta de Juliette e seus diálogos impagáveis com Warner, os questionamentos inocentes e ao mesmo tempo capciosos de James, e o grande espaço reservado ao desbocado e deveras sarcástico Kenji (um dos meus personagens favoritos), estão entre os acertos de Mafi, acertos que imprimem fluidez à narrativa e te fazem passear pelas páginas de Incendeia-me.

Mas gente, é o último livro da trilogia e é preciso encerrar com propriedade a parte da batalha contra o Restabelecimento, quem sabe um vislumbre de um futuro mais promissor… mas, até mais da metade do livro nada acontece no lado bélico da história. Faltou dosar um pouco o romance e a ação. Este receio foi ainda maior quando Mafi revela sua solução para a problemática representada pelo Restabelecimento. Não é um plano fácil, na verdade é um plano que carrega vários desdobramentos e que por si só já geraria material para mais um livro, como então poderia ser desenvolvido satisfatoriamente em cerca de 1/4 do livro? Pois é, não foi. O que ficou claro com Incendeia-me é que no fim das contas a trilogia Estilhaça-me era apenas mais uma trilogia romântica. Pouco espaço foi dado a luta contra o Restabelecimento (espaço que já foi maior nos outros livros é bom frisar) e eu esperava uma conclusão mais palpável. Incendeia-me termina em suspenso e a sensação de incompletude é bastante incômoda.

Conheça a Trilogia Estilhaça-me (Shatter Me)

Publicidade

Deixe um comentário

Arquivado em Editora Novo Conceito, Editoras Parceiras, Resenhas da Núbia

Gostou do post, então comenta!

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s