Miles Halter tem 16 anos mora na Flórida e já estava acostumado a não ter amigos, pelo menos não amigos verdadeiros, sua rede social resumia-se aquela estabelecida por necessidade com os esquisitões da escola. Talvez o que mais houvesse de extraordinário em sua ordinária vida fosse o fato dele viver a devorar biografias e colecionar últimas palavras de moribundos famosos. Foi por causa desse hábito que ele descobriu as últimas palavras do poeta François Rabelais: “Vou em busca de um Grande Talvez”. Determinado a deixar sua vida monótona de lado e sair em busca de seu próprio Grande Talvez, sem para isso esperar até o dia de sua morte, Miles resolve entrar para um internato no Alabama.
Em Culver Creek, seu companheiro de quarto será Chip Martin. Chip já é estudante de Culver Creek há três anos. É bolsista integral e para azar (será mesmo) de Miles ele não faz parte dos descolados. Os alunos que só frequentam a escola de segunda a sexta e retornam para a casa de seus papais ricos nos fins-de-semana. Mas, se Chip já chega dizendo que não o ajudará a ter uma vida social em Culver Creek, pelo menos também não o abandona, e o insere em seu grupo de amigos, até mesmo lhe dando um codinome. Forma-se assim a dupla Coronel (Miles) e Bujão (ironia mode on detected). É o Coronel que também lhe apresenta Alasca, a garota gata com pilhas e mais pilhas de livros no quarto, voz potente, fornecedora oficial de cigarros do Coronel e sua espécie de guru para assuntos sobre como aproveitar a vida. Ela promete fazer o mesmo por Miles, se ele descobrir a que labirinto Simon Bolívar estava se referindo em suas últimas palavras e como sair dele.
“Eu queria ser uma dessas pessoas que têm uma reputação a manter, que calcinam o chão com a sua intensidade. Mas, por ora, eu pelo menos conhecia pessoas assim, e elas precisavam de mim, assim como cometas precisam de caudas.” Página 64.
O grupo reunido por Green é coeso em sua incoerência. O Coronel e o Bujão são duas antíteses que casaram perfeitamente. Começaram como colegas de quarto, mas logo tornaram-se amigos e passaram a entender e prover as necessidades um do outro. Bujão com sua coleção de últimas palavras e o Coronel com seu pendor para a memorização de tudo relacionado aos países e suas capitais, renderam uma boa dupla. Takumi é aquele amigo meio sobrando, o que aparece pouco, não tem tanto espaço, mas que mesmo assim consegue ter uma participação memorável, com poucas tiradas, porém certeiras. E junto a esse trio vem toda a ebulição de Alasca. Seus rompantes, os choros, as bebedeiras, os planos audaciosos. A força motriz que os impelem a agirem em uníssono. E através de quem a maioria dos maus hábitos (fumo, bebidas, trotes…) são introduzidos no grupo.
Aos poucos, Bujão vai decifrando a misteriosa Alasca. A história por trás de sua impulsividade extrema, do imediatismo exacerbado e de uma certa banalização da vida. E quando finalmente acontece o algo mais tão sonhado por Miles, mais um drama atinge a vida de Alasca.
O livro está dividido em duas partes. A primeira traz a formação do grupo, a criação de sua identidade, o estabelecimento dos papéis a serem desempenhados e o fortalecimento das relações entre os personagens. Na segunda parte temos o evento catártico que promove mudanças drásticas na dinâmica do grupo e a forma como cada um deles passa a agir a partir daí.
Perguntas e mais perguntas e um sentimento de culpa imenso passam a ser companheiros constantes do Coronel e Bujão. Ambos começam então uma busca frenética por respostas para assim quem sabe mitigar a enorme culpa que sentem. E é claro que os dois se aproximam mais ainda, mas também passam a brigar muito mais. E para superar essa fase, nada como muito diálogo e outro evento catártico. Foi a guinada maravilhosa, que garantiu o toque agridoce, que promoveu a reconstrução do grupo, a superação da dor, a resignação de que algumas perguntas nunca serão respondidas, o perdão para a sensação de culpa e a esperança para sobreviver no labirinto que é a vida. A “Busca pelo Grande Talvez” era a meta de Miles, “Como sair desse labirinto?” a pergunta que sempre intrigou Alasca. Ambos, ao se encontrarem, misturaram metas e perguntas e assim promoveram mudanças na vida um do outro e nas pessoas ao seu redor.
Quem é você, Alasca? trata sobre vários temas envolvendo o mundo dos jovens (sexualidade, bebidas, cigarros, amizades, pactos, crenças) mas sem a pretensão de fazer julgamentos moralistas. Não é uma história sobre péssimas escolhas e sobre o que devemos evitar. É acima de tudo, uma ode às experiências, ao crescimento via erros e acertos, à persistência perante os percalços e seguir em frente mesmo sem respostas. Talvez resida aí o fato que levou o livro a ser abolido em várias escolas americanas. Uma ação que renega o fato de que os adolescentes possam julgar por si mesmos o que é bom e ruim e que suscitou uma resposta à altura por parte de Green (infelizmente não achei o vídeo legendado, se alguém tiver o link por favor poste o link nos comentários para que todos possam entender a resposta dada por Green).
Quem é você, Alasca? é o romance de estreia de Green. O livro acabou de ganhar uma nova edição e tradução pela Editora Intrínseca. Essa edição também conta com um guia de leitura escrito por Green. Nele, o autor responde dúvidas enviadas por leitores pelo Twitter e pelo Tumblr. E lança perguntas, que segundo ele, são intencionalmente vagas e amplas com o objetivo de gerar dúvidas e discussões. Entre os romances solo de John Green que já li, sem dúvida nenhuma, Quem é você, Alasca? é o favorito.
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Na primeira vez que li esse livro, não gostei muito, mas depois, parei, voltei e reli – virou meu favorito do Green. Amo a Alasca como personagem e acho muito legal como ele brinca com a idealização dela. De início parece um livro sobre jovens-fazendo-nada-da-vida-e-esperando-ela-passar – e é mais ou menos isso, mas não é SÓ isso.
Beijos!
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Você fez essa resenha de uma maneira super adulta e séria! Eu adoro resenhas assim!
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Oi Helena, fico feliz que tenha gostado. Obrigada pela visita! 😉
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