“Quando não temos noção de tempo e espaço, parece que perdemos direção.
Parece que perdemos dimensão.
E quando os perdemos, tudo ao redor acaba virando eternidade.
É a eternidade que nos observa.
Que nos aguarda.
E que nos engole. ”
(Página 92)
A Juliana Fiorese é bastante conhecida nas redes sociais por suas ilustrações características de personagens com cabeças e olhos grandes. Seus marcadores de livros são realmente coisas lindas de se ver. Das ilustrações para criar suas próprias histórias foi um passo natural e Clara Carcosa, sua primeira HQ, reflete bem isso.
A trama conta a história de uma garota perdida que se vê envolvida por seus maiores medos: solidão, escuridão e silêncio profundo. Ela não sabe em que lugar está e como foi parar ali e por isso, decidiu seguir as misteriosas sombras, a única companhia que tem neste lugar.
Os trabalhos de Fiorese sempre transparecem seu amor pela literatura: autores, seus romances, personagens e adaptações, são protagonistas na maioria de suas obras. E é claro que toda essa influência iria transparecer em outros projetos seus. No caso de Clara Carcosa, a principal influência é conto de Ambrose Bierce, Um Habitante de Carcosa, publicado pela primeira vez em 1886. A história fala sobre um homem que se encontra perdido em um velho cemitério, tentando voltar para casa. E em menor parte, no livro de contos de Robert W. Chambers, O Rei de Amarelo (1895) que traz uma coletânea de histórias baseadas em uma fictícia peça de teatro que enlouquece todos que a leem até o fim. Já dá para imaginar o que esperar de Clara Carcosa né? Uma trama sombria, sufocante, com uma protagonista que não aceita sua atual condição e com um passado um tanto desesperador. E olha, também sobra um espacinho para um flerte com a cultura da Paraíba (terra de Fiorese) e uma lenda bastante popular.
Quanto a paleta de cores, não poderia ter havido escolha melhor. Os tons de azul, preto e cinza para o lugar em que Clara está e os tons de vermelho, laranja e amarelo para as lembranças da protagonista, além das transições entre elas, refletiram muito bem a sensação de medo, de solidão, de calidez e de saudade.
Ao ler Clara Carcosa fiquei com a impressão de que a trama poderia ter explorado mais o passado de Clara e o misterioso lugar onde ela está, mas entendo também a limitação que um projeto gráfico deste porte carrega inerentemente. Não dava para colocar muito mais páginas sem encarecer muito a obra final. E, na medida do possível, e para um primeiro trabalho se aventurando no roteiro e nas palavras, a Juliana entregou um trabalho muito bom e que vale a pena ser conferido. Para finalizar, só posso dizer que os desenhos da Fiorese são fofinhos, mas conseguem ser horripilantes ao mesmo tempo.
Clara Carcosa é fruto de um financiamento coletivo lançado pela Juliana no Catarse. Não sei se ainda há exemplares disponíveis para venda, mas entra lá nas redes sociais da Juliana e pergunta:
Instagram – @julianafiorese