
A Terceira Vida de Grange Copeland é o primeiro romance de Alice Walker. Escrito entre 1966 e 1969 foi finalizado quando Walker tinha apenas 25 anos. Com sua trama pungente, dolorosa e que causa asco e revolta em muitas de suas passagens, Walker entrega uma trama de um ciclo sem fim de sonhos e projetos para o futuro, sendo massacrados por repetidas derrocadas que perpassam gerações na família Copeland. Com eles, uma família negra do sul dos Estados Unidos, Walker escancara o ciclo do racismo ao qual muitos negros se viram presos durante a chamada reconstrução pós abolição.
Pode-se reconhecer três grandes partes na obra de Walker, três partes de um ciclo que engloba três gerações da família Copeland. A primeira começa no núcleo familiar composto por Grange, Margaret e Brownfield, este último quando tinha somente dez anos. A trama tem início com Brownfield e os pais se despedindo dos tios e primos que moram na Filadélfia. Estabelece-se assim o confronto de realidades distintas e contundentes, um exemplo caro do “racha” norte versus sul para a comunidade negra norte-americana. Ali na Georgia, a vida da família Copeland segue sem perspectivas de melhorias e em cinco anos Brownfield vê a sua vida sofrer uma guinada, para pior. O pai foi embora, a mãe e o irmão menor morreram, Brownfield foi deixado sozinho, deixado para herdar o destino do pai, de se tornar um eterno devedor de um homem branco. Ele foge com os pensamentos no norte, mas acaba parando em um condado próximo…
Tem início a segunda parte, protagonizada por Brownfield. Aqui também conhecemos outros personagens importantes. Josie, que foi o grande incentivo ara Grange abandonar a família, Lorene e Mem. Com Mem ele se casa e vai trabalhar em uma lavoura, não muito distante da que ele fugira anos antes. É assim que ele se coloca em um caminho que ressoa o trilhado pelos pais. Casado com Mem, com vários filhos (alguns mortos), endividado, adepto à bebedeira e ao espancamento da esposa. Amante de Josie…
“Sua raiva podia atribuir, e atribuía, a culpa de tudo a Mem. E ela aceitava todo os fardos dele, além dos dela própria, e lidava com eles munida de seu grande coração e de seu grande conhecimento. Ele não se ressentia dela por ter um grande coração, mas não a perdoava por ter um grande conhecimento, pois isso a colocava mais perto, em termo de poder, deles do que ele jamais estaria.” (Página 83).
A transição para a terceira parte é mais sutil, mas vem marcada por Daphne, a filha mais velha de Brownfield e Mem, que agora ressoa os antigos desejos de infância do pai. E Ruth e seu relacionamento com o avô Grange. Essa última parte é marcada pelo desejo de vingança de Brownfield, pela redenção de Grange e pela derrocada final da família Copeland. Não há final feliz, a vida para os negros no sul dos Estados Unidos no período retratado por Walker não era fácil nem esperançosa. Imersos em meio à violência e à pobreza, sendo em menor escala algozes de seus dependentes, enquanto seguem tendo seus próprios algozes que os prendem a uma vida de privação, ainda escravos mesmo sendo “livres”, é difícil ver uma luz no fim do túnel, um fim para esse ciclo, de sonhos sendo constantemente massacrados. Resta o alento proporcionado pelo início do movimento pelos direitos civis no sul e pelo direito do negro votar, assuntos tão habilmente inseridos na trama por Walker.
*A Terceira Vida de Grange Copeland foi o livro enviado pela TAG Curadoria em Maio de 2020. A curadora foi a escritora, cordelista e poeta brasileira, Jarid Arraes.
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