Dez Lições sobre escrever que todo cientista deve aprender (via Alternative Hypothesis)

Ten lessons about writing that every scientist should learn... Yesterday, I spent the day at the horse races, taking in the pomp and pageantry of the biggest stakes card of the year. I find the racetrack fascinating, and not just in that girlish horse-crazy sense. For starters, it’s the only place I know where it is normal to see small men wearing outrageous colors and women wearing birds on their heads. Second, I love the wordplay of the racing form, with horse names like Two Horn Unicorn, Tiny Giant, We Ta … Read More

via Alternative Hypothesis

Eu já comentei algumas vezes que eu gosto de ver o que os blogueiros de outras partes do mundo estão postando. Um jeito legal de fazer isso é visitando a página principal do WordPress, que tem alguns artigos legais que foram publicados recentemente. Esses dias, vi um post de um blog chamado Alternative Hypothesis que dava dicas para pessoas que estão escrevendo artigos científicos (e  que se aplica, logicamente, a todo mundo que escreve para outra pessoa ler). Gostei tanto das dicas, que perdi permissão para traduzir o post, que segue:

Ontem, eu passei o dia no jóquei clube, curtindo a pompa e desfile dos maiores cartões de aposta do ano. Eu acho a pista de corrida (de cavalos) fascinante, e não apenas daquela maneira de menina apaixonada por cavalos. Para começar, é o único lugar que eu conheço onde é normal homens pequenos usarem roupas de cores ultrajantes e mulheres usarem pássaros na cabeça. Depois, eu gosto de como brincam com as palavras nos nomes dos cavalos, com nomes como Two Horn Unicorn (Unicórnio de dois Chifres), Tiny Giant (Gigante Pequeno), We Taught Ed (Nós ensinamos o Ed, mas a frase, falada rápida, soa como “retarded”, que é retardado), e o eterno primeiro lugar: Sir Sits A Lot (Senhor Senta muito, que soa como “Sure Shits A Lot”, que seria algo como: certamente faz muitas fezes).

Mas enquanto as distorções das palavras normalmente faz meu lado escritor rir, tem limites. Pegue, por exemplo, Meagans Princesses, cujos crimes contra a gramática me impediu de apostar nele. Eu podia quase perdoar o apóstrofe formador de possessivo que estava faltando, mas a princesa no plural simplesmente não deu*. Meus amigos ficaram chocados que eu rejeitei um favorito 2-1 baseado em gramática, mas eu acho que é por isso que eu sou uma escritora, e não um “café com leite”. Não consigo me segurar. Para alguns é apenas um apóstrofe faltando. Para mim, é um tiro ouvido através do mundo**

*Em Inglês, o sentido de posse é passado numa frase através de um apóstrofe seguido de um s. Assim, “Casa da Mari” ficaria “Mari‘s House”. A autora está reclamando que está faltando o apóstrofe em Meagans, para indicar que o cavalo seria a princesa de uma moça chamada Meagan. E o outro erro que ela não perdoa é princesa estar no plural (Princesses), dado que é apenas um cavalo, não dois.

**A expressão que a autora usa “Shot heard ‘cross the world” normalmente se refere ao assassinato do arquiduque Franz Ferdinand (vocês acham que o nome da banda era criativo?), que foi um dos estopins da Primeira Guerra Mundial. No texto, ela se referiu ao assassinato da gramática mesmo.

Ok, então talvez eu seja um tanto obcecada, mas isso não fica só na pista de corrida. A escrita científica está repleta desse tipo de tiros. Às vezes as frases estão tão torcidas e cheias de jargões que elas não possuem nenhum significado. É escrita morta.

Você sabe do que eu estou falando. Aqui está um dos meus favoritos, de um artigo sobre aquicultura:

É, no entanto, irônico que até a data presente, espécies de peixes comestíveis que se alimentam mais para baixo na cadeia alimentar predominem na aquicultura global, apesar de por inúmeras razões, na maioria dos lugares, aquicultura é vista como um setor que é predominantemente confinada a alguns commodities de alto valor, como salmonídeos e camarão.

Tradução: Embora a maior parte das pessoas ache que a aquicultura mundial se limita a alguns commodities como salmão e camarão, na verdade são outras espécies de peixe as predominantes.

Eu amo esse exemplo, porque ele ilustra muitos pecado comuns da escrita científica: 1) a frase de transição longa, mas sem significado (É, no entanto, irônico que até a data presente); 2) qualificadores combinados (por inúmeras razões, na maioria dos lugares); 3) voz passiva (aquicultura é vista como um setor); 4) repetição de palavras similares, quando uma delas é um advérbio desnecessário (predominem/predominantemente); e 5) o tamanho da sentença em geral (50 palavras – no original em inglês).

Eu vejo frases como essa todos os dias, e elas me frustam porque eu sei que são escritas por pessoas inteligentes, cujas idéias e percepções merecem melhor. Essas são pessoas que preferem se voluntariar a encher jarros de esmola por um mês a se voluntariar a escrever um paper*** a mais. E quem os pode culpar? Provavelmente, nós todos fomos traumatizados pelo currículo do ensino médio, cujo único objetivo era fazer os estudantes aprenderem a escrever a “redação perfeita” em menos de duas horas****. Considerando esse tipo de pressão, eu também odiaria escrever. Vamos quebrar o mito agora: a redação perfeita de duas horas não existe.

***Nome dado a artigos científicos

****Aparentemente, lá e aqui têm isso em comum!

Prosseguindo…

Isso é o que você realmente precisa saber sobre escrever na ciência:

1) É tudo para o leitor. É isso aí. Tudo que você sempre ouviu nos laboratórios da graduação sobre ser sobre os “resultados” é bobagem. O propósito de escrever sobre ciência é para comunicar os resultados, mas a palavra operante aqui é comunicar. Comunicação só ocorre se a sua audiência entende a mensagem – então não é apenas sobre o que você escreve; é o que eles lêem.

2) Respeite o tempo do leitor. Seus leitores são pessoas ocupadas. Se você quer que eles entendam sua mensagem, você tem que torná-la fácil para eles. Não desperdice o tempo deles, e não os faça trabalhar muito para entender. Eu recomendo o livro de William Zinsser, “On Writing Well,” (Sobre escrever bem) a meus colegas porque oferece excelentes conselhos para escrever, mas também porque o seu estilo de escrever é um prazer de ler.

3) Não faça o leitor cair de um penhasco. Eu frequentemente digo aos estudantes que escrever é como passar direções para alguém. A informação tem que fluir em uma ordem lógica do ponto A para o ponto B, para que o leitor consiga seguir sem fazer uma curva errada ou cair de um penhasco. Cada frase tem que passar uma idéia, e essa idéia deve levar à próxima e assim por diante. Lá no colegial, você provavelmente ouviu falar de “declarações de tese” e provavelmente odiava isso. É justo. Mas quando você começa uma frase, ou um parágrafo, ou um paper, tem que dar aos leitores uma prévia de onde vai chegar, e se basear nisso.

4) Diga ao leitor que hora são, não como o relógio funciona. Como cientistas, nós temos o hábito de detalhar, e às vezes, nos perdemos nisso. Raramente é necessário contar a história completa do seu assunto para chegar no contexto do seu estudo em particular. Quando escrevendo as informações para a parte introdutória, foque nas idéias mais relevantes que levaram à sua hipótese. Você não tem que contar toda a história – apenas a parte que é importante para o seu trabalho. Isso está relacionado ao ponto anterior – se você está desenhando um mapa para alguém, você não tem que dar a eles a história completa da loja de conveniência que eles vão passar no caminho. Ao invés disso, você vai dizer onde está localizada e para onde eles têm que virar quando chegarem lá.

5) Garanta que cada palavra cumpre sua função. Você sabe qual a melhor coisa de ser um escritor? Você é o chefe. As palavras trabalham para você. E se não estiverem funcionando, você pode dar uma de Gordon Ramsay e mandá-los para longe da sua cozinha. Cada palavra deve contribuir para a frase, cada frase para o parágrafo, e cada parágrafo para o todo. Chute advérbios e tire nomes. Não tenha piedade.

6) Escreve uma palavra de cada vez. Isso é só um reformulação da regra 5. Quando você escreve, e especialmente quando você reescreve, preste atenção a cada palavra. Tenha certeza que ela transmite o sentido desejado. O livro de William Brohaugh, “Write Tight” tem alguns exemplos bons de palavras que devem ir para o bloco de desprezadas. (Embora eu deva confessar que eu não sou uma grande fã do livro – depois que demorou 60 páginas para descrever “16 tipos de verborragia”, tudo que eu conseguia pensar era “Por favor, escreva mais concisamente!!”). No topo da lista dos papers: “Devido ao fato de” (diga apenas “porque”), “Nossas observações mostram que” (diga “nós observamos que”), “É interessante notar que” (simplesmente note).

7) Não é o tamanho das suas palavras, mas como você as usa. Isso não é Scabble*****. Você não ganha pontos extras se usar todas as letras ao seu dispor. Não tem problema usar palavras curtas. E enquanto você está nisso, desista de frases pretensiosas como “os resultados supracitados…”.

*****Um jogo parecido com palavras-cruzadas no qual você tem que montar palavras usando blocos com letras e ganha mais pontos se fizer palavras maiores.

8) Leia seu trabalho em voz alta. Nós lemos com nossos olhos e ouvidos. Quando você lê em voz alta, vai captar todo o tipo de coisas que seus olhos não viram. Vai sentir imediatamente quando você tropeçar numa frase, ou ficar sem ar porque a frase é longa demais.

9) Tire um descanso. Quando você tiver terminado um rascunho, guarde-o por pelo menos uma hora, preferencialmente um dia ou mais, antes de revisar. Boa escrita normalmente exige vários rascunhos, e não há caminhos curtos.

10) Leia. Leia de tudo. Leia textos bons. Leia textos ruins. Leia a caixa de cereal. Quando você lê textos científicos, leia de disciplinas diferentes. Leia artigos velhos (veja meu post antigo sobre a simplicidade de papers científicos mais velhos). Desenvolva um ouvido para linguagem – para gramática, estilo e estrutura. Adquira um senso do que funciona e o que não funciona, e então tente entender o motivo.

E agora, em outra nota, vou deixá-los com alguns exemplos de gramática ruim “na natureza” – para o caso de você achar que o exemplo das corridas no começo foi simplesmente obsessivo demais.

Many people use this microwave. Please be sure to clean up all the messes in the microwave as soon as it happens!

Muitas pessoas usam este microondas. Por favor, certifique-se de limpar todas as bagunças assim que ela ocorrerQuantas bagunças há, exatamente? E se “bagunças” é plural, porque “ela” é singular?******

******Em inglês, a palavra mess (bagunça, sujeira) é “uncountable”, ou seja, bagunça é bagunça, não tem como contar (em português também é meio assim, mas todas as bagunças não nos parece tão estranho quanto “all the messes”).

Gilled chicken breat

Eba, peito de galinha guelrada*******. É uma ave aquática de que não ouvimos falar?

*******Na descrição do prato, abaixo do nome, faltou um R em Grilled, deixando Gilled, que é um adjetivo para “com brânquias” – o órgão respiratório de animais aquáticos, como peixes.

"...reduces the energy consumption used."

Coca Cola equipou esta unidade com um sistema único de gestão de energia que mantem as bebidas geladas e reduz o consumo de energia usado.

Pouco redundante? Isso poderia muito bem dizer “reduz o uso de energia usado”. Credo.

Espero que tenham gostado do texto tanto quanto eu. Tentei traduzir de modo a não perder as notas engraçadas da autora, e expliquei quando em português elas perdiam o sentido. Obrigada novamente à autora por autorizar a tradução do texto (Thanks so much for letting me translate your post!).

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